sexta-feira, 28 de setembro de 2007

a egípcia


Vou ignorar o mundo e passar o dia lendo poemas.




Enquanto isso os hormônios furiosos chicoteiam os nervos e transformam pensamentos em armadilhas tentadoras. "Venha cá, meu bem, eu te prometo delícias" sussura um. "Deite-se nesta vala escura", me grita outro. "Dê a patinha e seja uma boa menina", outro.




Abro, ao acaso, o livro com capa de couro e páginas de papel bíblia, como um oráculo.




"De afetos, tenha a fria liberdade


Dos píncaros sem nada.


Quem quer pouco, tem tudo; quem quer nada


É livre; quem não tem, e não deseja,


Homem, é igual aos deuses."


Odes de Ricardo Reis pág. 219




E mais


"Entre o luar e o arvoredo,


Entre o desejo e não pensar


Meu ser secreto vai a medo


Entre o arvoredo e o luar.


Tudo é longínquo, tudo é enredo.


Tudo é não ter nem encontrar,


Entre o que a brisa traz e a hora,entre o que foi e o que a alma faz,


Meu ser oculto já não chora


Entre a hora e o que a brisa traz.


Tudo não foi, tudo se ignora.


Tudo em silêncio se desfaz."


Odes de Ricardo Reis pág. 407




Minha tarde tem um travo amargo, um arrepio na espinha, uma overdose de emoção que me deixa nauseada. "Da cor da náusea que se sente me viagens de carro", como escreve o mestre Jonathan Franzen.

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